1. |
Em marcha
03:06
|
|||
Em marcha (A. Marceneiro/Pierre Aderne/Luiz Caracol)
Sou um resto de mistura
Entre o vira e o batuque
E as noites acordado
Com o balanço na cintura
Vou seguindo o azimute
Em silêncio com o meu fado
O meu sotaque é o canto
Certidão e passaporte
Dos quintais lá de lisboa
Oferenda para o santo
O meu terço a minha sorte
Para me guiar na proa
Lanço a vela em maré alta
Com o vento do meu lado
A caminho da sodade
Olho o céu que me faz falta
Peço a bênção e calado
Levo o rio e a cidade
Ao chegar ao meu destino
Vou deitar a minha alma
Nas areias da baía
Para ouvir tocar o sino
Respirando a sua calma
E bebendo à alegria
|
||||
2. |
Samba do bairro
04:17
|
|||
Samba do bairro (Luiz Caracol)
Saía de casa apressada
Descia a pé a calçada
Achava ser dona da rua
Que toda cidade era sua
Comprava tabaco na esquina
Falava com voz de menina
Seguia pelo bairro a fora
Com o olhar de quem devora
Parava à noite no chico
Onde havia fado vadio
Pra se dar ao bailarico
E alternar ao desafio
Vendia ares de segura
Com opinião solene
E como diz o Godinho
Ela queria ser Dietrich
Mas nem chegou a Marlene
Sorria como quem sabia
Usava as frases que ouvia
Passava em bicos de pés
Por cima da sua altivez
Andava toda decidida
Sonhava marchar na avenida
Trazia as roupas cintadas
E as novas curvas compradas
|
||||
3. |
Metade
03:55
|
|||
Metade (Fernando Terra/Luiz Caracol)
Metade do que se é
É o que é o pensamento
Metade do dia é noite
A outra metade invento
Metade do mundo é fraco
A outra, sabe-se, é forte
Do meio pra baixo é sul
E o outro meio é norte
Na parte boa de mim
Há uma outra assim assim
Não se aguentam, não se dão
Uma é sim e outra é não
Muitas metades existem
Acho que não são só duas
Creio que há outras metades
Mais que as minhas e as tuas
Metade serve a Deus
E a outra ao Belzebu
Metade de mim sou eu
A outra metade és tu
Metade do corpo é água
A outra é alma, pois é
Meia metade é Maria
E a outra meia é José
Metade vai, metade vem
Metade mal, metade bem,
Metade com, metade sem,
Metade a mais, metade aquém
Metade não, metade tem
Metade sim, metade nem
Metade cai, metade quem
Metade aqui, metade além
|
||||
4. |
Moro em ti "Lisboa"
03:27
|
|||
Moro em ti “Lisboa” (Gonçalo Pimenta/Luiz Caracol)
Acordo com os teus cheiros de ontem
Sinto neles as cores que te cobrem
Preto, branco, amarelo, encarnado
Mas raça tens tu
Que indiferente me evitas
És da laia dos poetas
És portuguesa, moura de África
Levas-me a uma nova América
Deixas-me de olhos em bico
E eu por aqui me fico
Pois mesmo distante
É de ti que sou amante
Moro em ti,
Flor, de lis, de lírio
Moro em ti
Moro em ti,
Flor, de lis, de lírio
Lisboa
Sei que não me és fiel
Fintas-me com uma canção
Fado, funk e futebol
Fazem parte do rol
De desculpas que tens à mão
Para provarem o teu mel
Quando finalmente consigo
Que passes um dia comigo
Fazes da noite um poema
Em que o único dilema
É saber se é verdade
Que sai dos teus olhos saudade
|
||||
5. |
Vai lá
04:10
|
|||
Vai lá (Luiz Caracol)
Ora, não vamos falar agora
Nem jogar conversa fora
Sobre a lógica na terra
Chora, não dá pra mudar a hora
Nem querer mandar embora
Todo o animal que ferra
Canta, tira os nós da garganta
Quem o faz o mal espanta
Mesmo quando a voz embarga
Planta, rega a paz que ela levanta
Guarda o que nela encanta
E desliga a banda larga
Vai lá, pra Marte então
Que aqui o amor é vão
Sente, só quem o consegue é gente
Mesmo que com repelente
Prá picada não ser forte
Mente, se for leve e indiferente
Se te deixar ir em frente
E puder virar-te a sorte
Pára, escuta, esquece lá
Sara e desce do sofá
Vai lá, pra Marte então
Que aqui o amor é vão
Mas leva ar na mão
E chega salvo e são
|
||||
6. |
Não quero
04:18
|
|||
Não quero (Luiz Caracol)
Noutra vida fui ateu
Numa outra fui cristão
Já fui espirita e judeu
No meio da lamentação
Antes disso fui hindu
Ouvi xamãs no Havai
Fui jaina e fui shinto
E pajé no Paraguai
Do Tibete vi o mundo
Do Alaska a Zanzibar
E percebi num segundo
Porque o quiseram roubar
Hoje bebo água pura
Não quero religião
Já vi tanta releitura
Impostura e conjectura
Que hoje já não quero não
Com Lutero protestei
Com Confúcio fui na fé
Na umbanda passeei
Com os orixás a pé
Fui budista até ao fim
Em Meca segui Alá
De Santiago a Pequim
Levei muito do que há
Vi diferença em Salvador
Divisão no mar Egeu
Desrespeito em Timor
E é por isso que eu
Pois prefiro estar a sós
Se eu quiser falar com Deus
|
||||
7. |
Sai
03:07
|
|||
Sai (Luiz Caracol)
Não te quero mais
Nem que olhes meio de lado como gostas
Tu vê lá se sais
Que já chega de te carregar às costas
Não me acostumei
Que te afundes em agruras e arrelias
Mas já me cansei
Do amargo que tu trazes aos meus dias
Nada corre bem
Fica tudo aquém
Pena ser assim
Seja como for
Não vale o amor
Que tirei de mim
Sai. Vai só ver se eu tou lá fora
Sai. Não te escondas tá na hora
Sai. Já é tempo de ires embora
Sai. Sai agora
Não te quero ouvir
Essa tua lengalenga já não entra
Para de insistir
Que não damos certo nem com água benta
Lava o teu astral, que ele faz tão mal
É melhor que o consigas afastar de ti
Leva o que é banal, muda de canal
Que esse filme que tu fazes acabou aqui
|
||||
8. |
Tou farto
03:29
|
|||
Tou farto (Luiz Caracol)
Tou farto da maneira como se safa a censura
Tou farto da maneira como a calma já não cura
Tou farto da maneira como a mente é iludida
Tou farto da maneira como o crente já duvida
Tou farto da maneira como a falta atordoa
Tou farto da maneira como a gente vive à toa
Tou farto da maneira como tudo anda louco
Tou farto de tão pouco
Cansei-me desta loucura
Que luta, que só limita
Há muito que a dita dura
Há tanto que dura a dita
Tou farto da maneira como se cala a cultura
Tou farto da maneira como a fala não é pura
Tou farto da maneira como o medo é semeado
Tou farto da maneira como o segredo é guardado
Tou farto da maneira como a culpa é de ninguém
Tou farto da maneira como o pobre nada tem
Tou farto da maneira como tudo anda louco
Tou farto de tão pouco
Cansei-me desta loucura
Que luta, que só limita
Há muito que a dita dura
Há tanto que dura a dita
Tou farto, tão farto
Da dita, que dura, que finta, que fura
Que agarra, que atira, que amarra, que tira
Que vende, que finge, que prende, que cinge
Que esmaga, que mói, que mata e corrói
|
||||
9. |
Lá em casa
03:34
|
|||
Lá em casa (Pedro Luís/Luiz Caracol)
Lá em casa havia amor, todo ano, todo o dia
O bairro acordava cedo, mas a nossa mãe ficava
Mas a nossa mãe ficava a fazer-nos companhia
Lá em casa havia luz, além da que se acendia
O pouco virava muito e esse muito chegava
E esse muito chegava, era o que se sentia
E eu era mais feliz
Só que ainda não sabia
Com tudo o que se fintava
Ninguém nunca se largava
E o sorriso não faltava
Porque a gente não queria
Havia fado e morna, bossa, samba e carvaval
Feijoada, arroz e pinga, muita farra no quintal
Havia semba e chula, marrabenta e muito mais
Moambada, açorda e ginga
E malta de outros quintais
Lá em casa havia paz, quase digna de um Nobel
Às vezes também chovia, mas o sol iluminava
Mas o sol iluminava, as voltas do carrocel
E eu era mais feliz
Só que ainda não sabia
Com tudo o que se fintava
Ninguém nunca se largava
E o sorriso não faltava
Porque a gente não queria
Havia fado e morna, bossa, samba e carvaval
Feijoada, arroz e pinga, muita farra no quintal
Havia semba e chula, marrabenta e muito mais
Moambada, açorda e ginga
E malta de outros quintais
Lá em casa havia amor
|
||||
10. |
Falhou na dança
03:37
|
|||
Falhou na dança (Luiz Caracol)
Ele jogava ao berlinde
Era craque na carica
E safava-se ao peão
Sabia atirar o prego
Dava dez toques na bola
Sem a deixar ir ao chão
Voava de bicicleta
De skate e de patins e afins
Ela era barra na corda
Curtia jogar ao mata
Dava flicks e mortais
E corria à apanhada
Saltava cercas e muros
Até já não poder mais
E ganhava-lhe à macaca
Com o seu golpe de rins e afins
Entretanto ela cresceu
E quis levá-lo ao baile, mas ele falhou na dança
E ela numa de vingança, embrulhou-o no seu xaile
Com missangas coloridas, como um poema em braille
E trocou-o por outro
Só porque ele não sabia
Dançar como o Fred Astaire
Só porque ele não falava
Da maneira que ela quer
Só porque ele não vestia
Roupa cara da boutique
Só porque ele não morava
Numa casa muito chique
Ele andava no trapézio
Era bom às escondidas
E na malha tinha mão
Ela era do piolho
Era do gato e do rato
De perder nem a feijão
E já não olhava a meios
Para atingir os fins e afins
|
||||
11. |
O que vai ser
03:47
|
|||
O que vai ser (João Dionísio/Luiz Caracol)
É tanta a confusão
Sem quebra ou solução
É o juro e a jura que se vê
Não há como pensar
Nem fé, nem a falar
É o conto e a conta que se vão
A greve e o amanhã
A cobra e a maçã
Não sabem onde ir
O que vai ser?
O que vai vir?
Ai sim? O quê?
Nem quero ouvir
É tanta a condição
Sem regra ou direcção
É o luto e a luta que se vê
Não há como pagar
Nem dó, nem a ditar
É o verbo e a verba que se vão
A greve e o amanhã
A cobra e a maçã
Não sabem onde ir
O que vai ser?
O que vai vir?
Ai sim? O quê?
Nem quero ouvir
|
||||
12. |
Sou
03:29
|
|||
Sou (Luiz Caracol)
Tu, sabes lá por onde andei
Ou tão pouco de onde vim
Gostas de falar à toa porque sim
Dizes ser do tom da pele
Por não ter a mesma cor
Que tu consideras digna do amor
Que trago dentro, aqui
Que agora também dou
Quem sabe se no fim
Saibas que sou
Uma espécie da afro funk
Dos que perseguem o beat
Sou do reggae, sou do punk
Com os discos em repeat
Sou do groove cool e soul
Sem pulsar pseudo freak
Larga lá o teu control
Antes que me torre ou te frite
Tu, sabes lá o que escutei
Ou tão pouco o que senti
Gostas de julgar à volta, eu já vi
Dizes ser o que Deus quer
Seja lá o que isso for
Então pede-lhe uma ajuda
Neste assunto do amor
Eu sou da lata
Eu sou da luta
Sou acrobata
Sou da labuta
Eu sou da fala
Eu sou da cura
Sou da sanzala
Sou da mistura
|
||||
13. |
O mundo
03:52
|
|||
O mundo (Luiz Caracol)
O meu mundo não tem tecto
Não tem porta, nem portão
O meu mundo é sem fronteiras
E não tem bandeiras, é uma só nação
O meu mundo não tem muro
Não tem chave, nem chavão
O meu mundo é sem defesas
E não tem represas, é uma só visão
O meu mundo é de todos
É de nada e de ninguém
É de quem tiver vontade de embarcar também
O mundo anda à volta da revolta
Gira à volta de si
Não volta a andar à solta
E à volta, a passar de novo aqui
O meu mundo não tem medo
Não tem pressa, nem pressão
O meu mundo é sem divisas
E não tem medidas, é uma só moção
O meu mundo não tem credo
Não tem raça, nem razão
O meu mundo é sem dilemas
E não tem emblemas, é uma só canção
O mundo anda louco, preso, incerto
Perturbado, perdido e perverso
Sem sentido, encoberto
Descalço, despido e disperso
|
||||
14. |
Hoje e amanhã
04:08
|
|||
Hoje e amanhã (Luiz Caracol)
Ouvi dizer que ia acabar a Terra
Ouvi dizer que a Terra ia acabar
Mas nem quando ela erra vejo a
Terra em algum outro lugar
Ouvi dizer que ia parar a fome
Ouvi dizer que a fome ia parar
Mas nada me consome mais que a
Fome com que temos de lidar
E será que tudo irá mudar?
Até nós, se calhar...
Hoje, era hoje
Hoje e amanhã
Ouvi dizer que ia acabar a guerra
Ouvi dizer que a guerra ia acabar
Mas nada nesta terra faz a
Guerra dar a volta e não voltar
Ouvi dizer que ia parar a sede
Ouvi dizer que a sede ia parar
Mas nem toda esta rede muda a
Sede de poder neste lugar
E se a gente for ao fundo
Enquanto acelera o mundo
Que tem tudo para partir
Até cair num segundo
E se não acaba a guerra
Enquanto incendeia a terra
Que tem tanto para queimar
Até onde o mar a encerra
|
||||
15. |
Isto "Sentir"
04:53
|
|||
Isto (Fernando Pessoa/Luiz Caracol)
Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo, não
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação
Não uso o coração
Tudo o que sonho ou passo
O que me falha ou finda
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda
Essa coisa é que é linda
Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé
Livre do meu enleio
Sério do que não é
Sentir? Sinta quem lê!
|
Luiz Caracol Lisbon, Portugal
Luiz Caracol is a singer-songwriter who has at his work a very own identity and personality, consequence of the cultural
connection he has always had with the Portuguese speaking countries
His first solo album “Devagar”, released in 2013. In 2017 he released his second album "Metade e meia.
In 2021 he released the EP “só.tão”. His new album, recorded live at Namouche Studio, is finally available.
... more
Streaming and Download help
If you like Luiz Caracol, you may also like:
Bandcamp Daily your guide to the world of Bandcamp